domingo, 21 de dezembro de 2014

Capítulo 2: Lua de Sangue


CapítulO 2
Lua de Sangue


Acordar imaginando-se que acabara de ter o pior dos pesadelos, de certa forma, era normal para Wallace Wender. Se perguntar se estava sonhando ao acordar, de certa forma também era normal. Mas, acordar e se encontrar deitado e entubado em um hospital, isso sim era novo.
Para Wallace, os sentimentos sobre os hospitais eram conflituosos, pois foi em um hospital em que ele recebeu a noticia de que sua irmã não havia resistido à cesariana de emergência que foi feita em sua mãe no dia em que seu odioso pai tentou mata-la, mas foi ele que acabou levando um tiro no lugar.
 A lembrança daquele fatídico dia ainda era claro como água, e ele duvidava que algum dia conseguiria se esquecer.
Eram conflituosos, pois também ouviu dizer que eles dão comida grátis nos hospitais para os pacientes.
Tentou se levantar somente para sentir todo o seu corpo dolorido se recusar a sair daquela cama. A porta foi aberta e por ela passou um homem vestindo um jaleco e usando óculos.
- Oh... você acordou... – ele parecia surpreso. – Você teve muita sorte...
- O que aconteceu? – perguntou Wallace, mesmo tendo uma vaga noção do que ocorreu, mas se for sincero, ele esperava que aquilo tudo o que ele passou contra aqueles criminosos fosse apenas um pesadelo.
- Me diga você. – o doutor o encarou atrás daqueles óculos que parecia analisar ele por inteiro. Wallace desviou o olhar. O doutor suspirou. – Sou o Dr. Elias Tanner, o médico que te atendeu. Você foi encontrado no porto todo ensanguentado e com alguns ossos quebrados, seis tiros, além de uma concussão. Você ficou em coma.
Aquilo não fazia muito sentido, bom, parte daquilo. De certa forma, era obvio que os donos da fábrica o deixaram no porto, pois não queriam que aquilo levasse a ele. Já a parte em que ele devia estar morto, com todos os ossos quebrado e provavelmente radioativo com a quantidade de elementos bioquímicos que ele foi exposto. Mas, se ele estava vivo, quem era ele para reclamar?
- Por... hm... quanto... tempo? – ele conseguiu perguntar enquanto tentava se sentar pelo menos.
O médico olhou na prancheta.
- Quase cinco semanas. – Dr. Tanner respondeu. – Então, o que aconteceu, Sr. Wender?
Não estranhou o fato de ele saber seu nome, mesmo ele sendo um morador de rua, tinha documentos.
Wallace não sabia se devia comentar sobre o que aconteceu. Aquele homem se dizia ser seu médico, mas e se ele fosse um dos mercenários do chefão que tentou matar ele?
O médico suspirou mais uma vez.
- A policia esta ali fora protegendo seu quarto desde o dia em que você chegou, parece que eles estão cientes do que aconteceu. – o médico disse tentando da um ar de tranquilidade para Wallace.
- Então, acho que não necessidade de eu dizer o que aconteceu, se todos já sabem. – disse Wallace se fechando. Por um momento ele se deixou ser livre, se deixou ser lido, mas agora estava na hora de botar a mascara.
- Vou fazer alguns exames antes de te dar alta... – disse o médico saindo do quarto.
Apesar da enorme vontade de ficar e poder comer a vontade, o bom senso; pelo menos para ele, falou mais alto. Ele já estava em uma enrascada com o simples fato de ter sobrevivido à tentativa de homicídio dos criminosos, se eles soubessem que ele esta vivo, podiam temer que ele fosse testemunhar no tribunal, e isso não seria bom pra eles. Com toda certeza não era bom pra ele.
Ao tirar a agulha da veia em seu braço esquerdo com um pouco de dificuldade por causa da dor, ele viu um pingo de sangue se formar no local. De uma forma totalmente estranha, Wallace sentiu seu corpo ser atingido por uma corrente de adrenalina. Todo o cansaço e a dor desapareceram como um passe de mágica. Seu corpo se movia livremente de qualquer aflição.
Ele se levantou. Usava um robe azul do hospital. Sua vista percorreu ao quarto simples em que ele se encontrava, ou era um hospital publico, ou um hospital particular com ala para pessoas pobres. Ele rapidamente encontrou a porta para o banheiro. Suas roupas deviam estar lá dentro.
Ele sabia que devia se preocupar com o fato de uma hora pra outra seu corpo agir como se nada tivesse acontecido, na verdade era ainda melhor, ele parecia rejuvenescido. Ele sentia mais energia do que nunca, apesar de estar faminto. Mas, isso não o preocupou, pelo menos não por agora. Agora sua única preocupação era sair daquele hospital e tentar desaparecer, pois sabia que viriam atrás dele, os policiais e os criminosos.
Ao adentrar no banheiro, que por sinal era minúsculo, ele logo reconheceu suas vestes sob o armário metálico preso na parede.
Ao se despir, notou algo diferente no corpo.
- Uau... Eu tenho tanquinhos... – ele disse olhando pra seu abdômen.
Wallace não estava todo musculoso, apenas definido, como uma pessoa normal que vez ou outra faz alguns exercícios apenas para estar em forma.
- Estou sexy... – ele disse com um sorriso convencido. Ele chacoalhou a cabeça, agora não era hora pra ficar se achando a ultima bolacha do pacote.
Ele rapidamente se vestiu, sem perder tempo, ele olhou para a janela do banheiro, era minúscula, ele jamais passaria por aquilo, mas a do quarto já era outra história. Ele entreabriu a porta do banheiro e bisbilhotou para ver se não tinha ninguém presente. Finalmente parecia que a sorte estava do lado dele.
Ele saiu do banheiro e caminhou em passos largos ate a janela do quarto. Estava trancada com algum tipo de cadeado próprio da janela. Ele puxou a tranca, mesmo sabendo que aquilo era impossível de se fazer, ou não. A tranca se partiu ao aperto dele.
Ao abrir a janela, viu que ate o chão, era uma queda de uns cinco metros. Ele soltou três lufadas de ar.
- E eu perdi o natal, e olhe que eu tinha tanto o que agradecer no dia de ações de graça... E ainda por cima, neve... – ele suspirou quase apaixonado. – Eu amo neve... Deve ser uma ótima experiência para os pobres que vivem nas ruas, como eu...
Ele olhou mais uma vez para a calçada coberta por uma fina camada de água. Provavelmente, pensou ele, foi usada para derreter o gelo. Amontoados de flocos de neve eram visíveis por quase toda parte. Ele suspirou.
- Eu consigo... Não é tão alto assim... Eu só posso ter batido a cabeça...
E assim, ele subiu a janela, soltou mais uma lufada de ar, nervoso com a possível morte ou paralisia nas duas pernas.
- Eu definitivamente bati a cabeça... – e pulou.
Ele esperou pela dor eminente, mas apenas um formigamento que começou pelas pernas e subiu pelo corpo todo surgiu e desapareceu tão rápido como veio.
- Não acredito que deu certo... – ele disse se levantando e analisando o corpo pra ver se estava tudo inteiro, ao olhar para os pés, sua boca faltou escancarar. – Não acredito...
Abaixo de seus pés e ao redor, a calçada estava toda rachada pelo impacto que sofreu com a queda de Wallace.
- Não acredito... – ele repetiu sem acreditar no que estava testemunhando.
Seus ossos não estavam quebrados? Ou pelo menos fraturados? Então, como era possível?
- HEY! – ouviu alguém gritar.
Ele se virou para a janela de sue antigo quarto e viu o Dr. Elias Tanner ao lado dos policiais o encarando.
- Desculpe doutor, mas estou me dando alta. – exclamou Wallace.
As pessoas a volta do hospital, observavam sem acreditar no que testemunharam. Wallace correu sem pensar duas vezes sendo pego de surpresa pela facilidade em que corria. Sua arrancada era mais veloz do que antes da tentativa do assassinato, ele corria mais rápido do que antes, e isso era simplesmente...
- Demais! – ele exclamou enquanto corria pela calçada desviando de pessoas e objetos.
Quem o assistia correr, imaginava que ele era um corredor olímpico, pois corria tão rápido quanto.
Seus passos eram leves e fortes, além de um equilíbrio superior. Não precisou pensar duas vezes para constatar que finalmente estava sendo recompensado pela vida que teve. Algo aconteceu naquele aterro da fábrica que o mudou, literalmente. Poderes, isso era realmente possível? Só havia um meio de descobrir.
Depois de virar várias ruas e correr sem se cansar facilmente por quase três quilômetros, Wallace entrou em um beco.
O sol já estava quase se pondo, e diferente do ultimo dia em que ele esteve acordado, o céu estava, bom, para os parâmetros da cidade, limpo e azul, apesar de ser inverno e quase neva todo dia. Isso já serviu para descartar a ideia de que ele fosse um vampiro, a não ser que... ele fosse um vampiro que não queima sob o sol, mas sim... ele esperava profundamente que não.
Ele também estava com fome, muita fome, mas ate o momento ele não quis atacar o pescoço de ninguém.
Ele olhou as mãos.
- Não custa nada tentar...
Foi ate a parede e pôs a mão direita primeira e tentou escalar como uma aranha. Isso anulou qualquer chance que ele tinha em ser um lançador de teia.
- Hum... Talvez, o sol seja a fonte de meus poderes...
Ele se agachou pondo o punho fechado direito na calçada. Respirou fundo. Concentrou-se e pulou com a esperança de voar. Bom, ele não voou, mas conseguiu atingir em torno de dois metros e meio de altura.
Caiu em pé, com um equilíbrio incrível.
Wallace encarou uma caçamba de lixo verde. Ela era grande e com toda certeza pesada.
- Quem sabe...
Foi ate ela, se agachou e com as duas mãos, a segurou por baixo.
- É tudo ou nada...
E por incrível que parece, ele levantou a caçamba sem fazer esforçou algum.
- Posso não ser um alienígena super-poderoso, mas com toda a certeza eu tenho uma super-força...
Sentiu sua mão arder. Comprimiu os lábios em dor. Colocou a caçamba no lugar e olhou a palma da mão direita. Algum pedaço de metal da caçamba o cortou. Um corte bem feio.
Ele não acreditou no que viu a seguir. Aquele rasgo enorme na palma da mão estava se curando. Levou cinco segundos para o corte sumir e deixar somente o sangue em sua mão.
- Não... – ele disse quase sorrindo. – Será...?
E assim, ele fechou as duas mãos em punhos e esperou que três garras de metal saíssem de cada punho. Nada aconteceu. Ele deu de ombros.
Virou-se pra ir embora, mas parou e pôs a mão no rosto. Será que ainda estava ali?
Ele correu para fora do beco e foi ate um carro estacionado. Usou o reflexo da janela para se olhar. Seu rosto não era mais aquele rosto magricelo e faminto, agora ele simplesmente parecia alguém que sempre teve o que comer, sempre teve uma vida boa. E a cicatriz que enfeitava seu rosto, havia desaparecido. Era como se ela nunca estivesse ali.
- Ah, qual é? – ele reclamou. – Eu ate gostava dela... Me lembrava de que eu podia sim revidar...
Seu estomago reclamou por estar vazio. Ele suspirou desistindo. Olhou para o horizonte, o sol já estava sumindo atrás de umas nuvens sob os prédios altos daquela parte da cidade. Ele se perguntou onde estava exatamente, pois ate o momento não havia reconhecido nada. Se demorasse muito, ele iria perder a comida que o centro de caridade perto da Ponte do Brooklyn distribuía para os sem-teto. Não era das melhores, mas servia para matar a fome.
Ao andar pelas ruas movimentadas daquela parte da grande cidade de Nova Iorque, Wallace fez questão de chamar atenção o mínimo possível, pois era possível ouvir o som de sirenes distantes a cada quarteirão.
As suas costas, o sol desaparecia por entre os prédios deixando um rastro âmbar no horizonte. Se imaginando se aquilo era apenas sua imaginação lhe pregando uma peça, Wallace olhou por cima do ombro. Desde o momento em que acordou no hospital, a sensação de estar sendo vigiado era constante.
Nada. Não havia nada anormal na rua, nada além dele, é claro.
Conforme dava cada passo, o céu ia perdendo a claridade fornecida pelos raios do sol e ia ganhando uma coloração azul a tons de negros. Rapidamente Wallace soube onde estava.
Ele estava bem longe de casa, do outro lado do rio. Distrito de Manhattan. Só soube onde estava, pois atravessando a rua se encontrava o Central Park.
Sua barriga reclamou como uma criança mimada, e ele não podia culpá-la. Estava faminto, bem mais faminto do que o costume.
- Aguente mais um pouco... – ele disse como se ela pudesse ouvi-lo. – Ótimo, agora estou dando de falar com minha barriga...
Ainda com o pressentimento de estar sendo vigiado, ele atravessou a rua e entrou no Central Park. A cidade já havia ligado suas luzes artificiais para ilumina-la, pois o sol já havia se posto e o céu estava coberto pelo crepúsculo. O Central Park estava coberto por neve. Apesar de suas vestes serem velhas, elas o aqueciam bem. Bem o suficiente para ele não morrer congelado.
Ao andar pelas calçadas do parque, Wallace não deixou de sentir que estava esquecendo alguma coisa. Algo muito importante, apesar dele claramente ter esquecido.
Com seu estomago reclamando novamente, Wallace desejou ter dinheiro para comprar algo pra comer.
- Se pelo menos eu tivesse um emprego... Droga! – ele reclamou de sua própria estupidez. – Não acredito que perdi minha chance de sair do fundo do poço...
Acontece que ao dia seguinte do qual ele testemunhou o assassinato e foi praticamente morto, Wallace teria uma entrevista de emprego. Isso mesmo, alguém estava disposto a empregar um morador de rua que não teve chance de completar os estudos no colégio e assim ter a chance de ir pra uma faculdade.
Ao se aproximar da Bow Bridge, a pequena ponte para pedestres do Central Park, Wallace se viu iluminado pela lua cheia e com o brilho dela, a sensação legítima de perigo.
- É impressão minha, ou alguém esta tentando me fazer associar a lua com experiências de vida ou morte?
Com seus sentidos aguçados; três vezes melhor do que os de um ser humano normal, Wallace soube que não estava sozinho, tirando o fato de que ainda havia algumas pessoas caminhando pelo Central Park.
Se ele pudesse descrever sua vida em uma única palavra, caótica serviria bem. A cada passo calculado que ele dava em direção à ponte, o numero de olhos que o observava parecia aumentar.
As pessoas que ainda ali estavam, pareciam sentir o perigo no ar e o bom senso falou mais alto. Uma a uma foram se afastando do local a passos largos.
Wallace parou em frente à ponte. De alguma forma, ele sabia que estava cercado. Seus ouvidos captavam os sons de vários passos. Seu nariz sentia o odor ao redor. Sangue misturado com um cheiro de morte.
Seja quem forem, estavam escondidos atrás das árvores, apenas esperando o momento certo para atacarem.
Não adiantava tentar fugir, não quando eram no mínimo uns vinte o cercando. Wallace quis chorar, e se não fosse pelo seu passado, chamar pela mamãe.
- Eu devo ter jogado pedra na cruz... – murmurou.
Não esperando qualquer reação de seus futuros agressores, ele arrancou em alta velocidade. Ao chegar ao ponto mais alto daquela ponte em forma de arco, ele saltou. Wallace estava ciente de que seu salto era em torno dos dois metros e meio de altura, com velocidade, essa altura poderia duplicar ou ate mesmo triplicar, ou ate mesmo quatro vezes; ele nunca foi bom em matemática.
E assim aconteceu, com a atual velocidade em que ele estava seu salto ultrapassou facilmente os três metros de altura. Sem dar chance alguma de perder a velocidade, assim que seus pés atingira o solo no outro lado da ponte, ele saltou, e desta vez foi ainda mais alto, ultrapassando os quatro metros de altura.
Seu plano era saltar por cima das árvores e assim passar vários metros de altura por cima dos inimigos e os evitar, pois ele tinha a sensação de que eles não eram normais, e isso foi comprovado com a cena a seguir.
As árvores se mexeram, e do meio delas, um vulto surgiu pelo ar como um foguete, deixando dois rastros de brilho escarlate, que logo ele descobriu serem os olhos da figura que surgiu a sua frente.
Foi tudo rápido demais, mas Wallace conseguiu ter um vislumbre do homem. Ele usava um sobretudo de couro preto. Seus cabelos chegavam ate os ombros, além de serem pretos e lisos. Um cavanhaque preto enfeitava seu rosto. E os dois pontos escarlates brilhantes, eram seus olhos.
O misterioso homem girou o corpo no ar e chutou o estomago de Wallace o mandando de volta para o outro lado da ponte. Ele pode sentir alguns ossos se quebrando com a força do chute.
Além de quebrar vários ossos, rasgar a pele e sangrar, assim lhe causando uma enorme dor e aflição, a calçada se rachou no local de impacto e o deixou em volta de pedregulhos.
- Ai... – ele choramingou.
Wallace sentiu alguns ossos de sua costela perfurando seu corpo, além de alguns outros ossos do corpo a vista.
Caído de costas no chão, seus olhos se direcionaram para a lua cheia. Tudo parecia ser a reprise de um filme ridículo, exceto pela parte em que agora não era homens armados tentando dar um fim a sua miserável vida, desta vez eram aberrações que saltavam a mais de quatro metros de altura e que tinham olhos vermelhos. E, pelo simples fato da lua estar no inicio de um eclipse lunar.
Era incomodo pensar que pelo menos uma vez na vida ele teria sossego. Ele queria pelo menos uma vez na vida não ter que se preocupar com o que iria comer, onde iria dormir, se iria sobreviver. Poder jogar todas as preocupações para os quatro ventos e aproveitar o momento. Não acreditava que isso era pedir muito. Por tudo o que passou e sofreu desde o seu nascimento, ele merecia ter pelo menos um dia para relaxar e curtir a vida, sem precisar carregar o peso do seu mundo nas costas. Pego de surpresa com a dor de seu corpo se regenerando, finalmente ele se deu conta.
Ele não precisava esperar um milagre. Não precisava ter mais medo. Não precisava mais fugir. Ele não era mais o mesmo. Não, agora ele também era uma aberração. Uma aberração capaz de chutar os traseiros dos seus inimigos.
Respirou fundo antes de se levantar e encarar o seu agressor que se encontrava em pé no meio da ponte, no mesmo momento em que todo o seu corpo terminava de se regenerar.
Ao redor, se tivesse que chutar, ele chutaria em torno de 80 pessoas de olhos vermelhos os cercavam esperando somente a ordem do líder sob a ponte para atacar.
Wallace percebeu que todos eles não esperavam que ele pudesse se regenerar. Ate mesmo ele não esperava que aquilo fosse capaz.
De alguma forma, apesar de ser inverno, o céu era enfeitado por poucas nuvens que aos poucos iam sendo coloridas por tons castanhos. A lua, por sua vez, se encontrava maior naquela noite, muito maior do que Wallace imaginou ser capaz.
A brisa fraca carregava leves flocos de neve e apesar do som dos automóveis percorrendo a cidade, o clima era tenso, o suspense era quase palpável.
Seu corpo, de alguma forma anormal, não sentia tanto frio quanto ele deveria. Ele se sentia mais leve, rejuvenescido, como se uma carga de adrenalina percorresse todas as fibras de seu ser. A fome ainda persistia, mas surpreendentemente, ele transbordava energia.
Sua visão estava ainda melhor do que antes. Nas partes mais escuras do parque, ele conseguia ver quase perfeitamente, além de conseguir ver as coisas de perto, como se ele pudesse dar um zoom duas vezes a capacidade normal de um ser humano.
Wallace estava em dúvida de como prosseguir. Ele devia dar o primeiro passo, ou esperar?
Em caso de dúvida, vai por uma terceira opção.
- Quem são vocês? O que querem? Por que estão me perseguindo? Estão apaixonados por mim? Vocês são gays? O que são vocês? E o mais importante, por que dos ridículos olhos vermelhos? São viciados? Andaram cheirando farinha...?
- AH! CALE ESSA MALDITA BOCA! – um entre eles exclamou. Todos eles pareciam a ponto de esganarem ele.
Bom, três deles estavam dispostos a isso ao se moverem em uma velocidade anormal para os olhos humanos que dificilmente conseguiriam ver o vulto deles, mas para Wallace era fácil. Não os conseguia visualiza-los em câmera lenta, mas podia vê-los como se fossem corredores olímpicos na velocidade máxima.
Wallace estava começando a ter uma vaga ideia do que aquelas estranhas pessoas de olhos vermelhos poderiam ser, ainda mais quando, por um mero vislumbre, conseguiu ver os dentes deles. Seus caninos eram maiores e pontiagudos, como se fossem presas animalescas.
O ataque daquelas estranhas pessoas foi impiedoso, e apesar de não ser nenhum faixa preta, branca ou amarela, seja lá qual fosse a faixa mais forte e fraca, Wallace viveu em várias lares adotivos com outros jovens encrenqueiros o suficiente para conseguir aprender a se defender.
Com o primeiro, ele se desviou do ataque e usou a própria força do inimigo contra ele e a sua recém-adquirida super-força para agarrar e girar o homem de olhos vermelhos e cabelo ruivo contra os outros dois e assim os lançando longe contra um grupo de onze inimigos.
- Strike! – ele fechou a mão em punho e fez um gesto comemorativo.
O líder na ponte estendeu a mão para o céu e logo em seguida apontou para ele gritando:
- ACABEM COM ELE!
Com exceção do líder, todos os outros seres se lançaram em direção a Wallace com o intuito de fazê-lo partir mais cedo para o paraíso; pelo menos é o que ele acredita ser seu lugar após a morte.
Usando todas as suas recém-adquiridas habilidades especiais, Wallace travou uma luta acirrada. Apesar de eles estarem tentando tirar-lhe sua vida, o jovem morador de rua não era capaz de matar alguém.
Sua força era capaz de lançar longe aquelas pessoas. Era capaz de quebrar os ossos deles, os fazer sangrar, mas infelizmente, apesar de ser bem mais lenta do que a dele, aquelas pessoas também podiam se regenerar.
Alguns deles lutavam como profissionais. Os golpes que o acertavam eram extremamente doloridos. Por mais que ele os derrotasse, os homens e mulheres sempre se levantavam em um ciclo infinito.
Wallace se regenerava a uma velocidade anormal, ate mesmo para aquelas criaturas, que a cada segundo que passava ele os considerava cada vez menos humanos.
Os minutos foram se passando e a luta parecia não ter fim. O líder daquelas criaturas apenas assistia tudo da ponte, sem dar o menor sinal de se envolver.
Além da força, dos dentes afiados e da velocidade, aquelas criaturas também possuíam garras extremamente afiadas e potentes. O estrago que faziam no corpo de Wallace era de causar aflição. Ele agradeceu aos céus por ter um fator de regeneração tão peculiar, mesmo considerando o fato de que aquela habilidade não ajudava em nada com a dor causada pelos golpes.
Se não fossem pelas luminárias espalhadas pelo Central Park e as luzes da cidade, o parque estaria bem mais escuro, pois a lua já estava coberta pela metade da sombra da Terra. O ar estava ficando cada vez mais afiado e barulhento. As nuvens, apesar de poucas, estavam sendo atraídas para o território aéreo do parque.
Aos poucos, os golpes de Wallace foram ficando mais fortes e potentes. As criaturas estavam começando a demorar bem mais longos períodos de tempo para se regenerarem. Já Wallace, se recuperava em questão de segundos. Era algo anormal para qualquer um deles.
E assim os minutos continuaram a se passar. Era um jovem de 18 anos contra um pouco mais de cinquenta pessoas. Uma hora depois ter sido chutado em pleno ar pelo líder daquelas pessoas, com o eclipse faltando em torno de meros 10 minutos para se tornar completo, Wallace finalmente começou a se cansar. A única forma de terminar com aquela luta sem fim seria começando a matar, mas isso estava fora de cogitação – pelo menos estava, aos poucos isso estava começando a parecer uma excelente ideia, ainda mais agora que ao ter suas duas pernas quebradas, dois vampiros o seguraram pelos braços.
- Você perguntou quem erámos e o que somos... – a voz do líder foi ficando cada vez mais próxima. Ele caminhava em passos arrogantes, cheio de confiança de que estava sobre o controle de tudo. – Não sei se você é burro, ou o quê, mas, acho que esta bem obvio o que somos, não acha? – ele disse dando um sorriso de escarnio e deixando seus caninos a vista de Wallace.
Wallace sentiu suas pernas se curarem, mas resolveu esperar mais um pouco, recuperar a energia que precisava já faz horas. Seu estomago se contorcia em lhe dizendo que precisa de combustível.
- São... vampiros... – disse Wallace fingindo estar fraco e sem forças.
O líder deu uma salva de palmas para ele.
- E esta... CORRETO! – ele exclamou como um apresentador de um programa televisivo de perguntas e respostas. – Antes de continuarmos, deixe-me apresentar a minha pessoa, pois não queremos ser rudes, não é mesmo? Sou Lander, rei da sociedade vampira de Nova Iorque. Agora, você deve estar se imaginando o porquê de alguém, tão importante quanto eu, estar atrás de um mendigo, como você?
- Hm... – disse Wallace. – Pra falar a verdade, estava me perguntando de onde foi que você tirou esse nome ridículo...
As palavras de Wallace afetaram o rei dos vampiros de Nova Iorque, Lander.
- Já perdemos tempo demais com esse verme, mate ele! – ordenou Lander.
Os dois vampiros que seguravam Wallace pelos braços, sem esperar pelo tempo de resposta do jovem, cravaram suas presas no pescoço dele e arrancaram pedaços. O corpo de Wallace ficou mole, os dois vampiros o soltaram confiante de que ele estava morto.
Antes de se chocar com o chão, Wallace se apoiou com as duas mãos e as usou para se impulsionar para trás e assim ele se levantou, e sem perder tempo se virando, usou os dois punhos fechados, para arremessar os dois vampiros longe com as costas de sua mão.
Em pé, olhando com ar de desafio para Lander, Wallace poder ver o espanto do vampiro ao testemunhar o pescoço dele se regenerar em segundos.
Wallace se encontrava coberto por sangue, tanto dele quanto dos vampiros. Aproveitando o momento de distração de Lander, Wallace se lançou contra o vampiro em uma velocidade acima de qualquer arrancada por um corredor olímpico.
Tarde demais para desviar, Lander foi arremessado longe com o soco que Wallace lhe deu no meio do rosto. Foi possível ouvir o som de ossos se partindo.
Aproveitando sua força e velocidade, junto com seus sentidos ampliados, os vampiros foram caindo um atrás do outro com os golpes desferidos por Wallace. Ele tinha certeza de que se fossem simples humanos, aqueles vampiros já estariam mortos, mas ao invés disso, estavam todos quebrados e ensanguentados.
Os vampiros iam caindo e não se levantavam novamente, pois com os ferimentos, só seriam capaz de se recuperarem em alguns dias, talvez horas se tomassem sangue.
Após derrotar todos os capangas, Wallace foi atrás do líder. Lander mal se aguentava em pé. Ele se encontrava apoiado no meio da ponte e com o rosto escorrendo sangue. Sem dar chances dele fugir, Wallace partiu pra cima dele o jogando contra o chão da ponte e, ameaçando o socar com força, Wallace perguntou:
- Por que vocês estavam atrás de mim? Por que queriam me matar? RESPONDA!
- Por que ele mandou...! – respondeu Lander temendo pela própria vida, como Wallace foi capaz de perceber.
- Quem? Quem foi que mandou?
Lander hesitou antes de responder:
- Você não faz ideia do que ele é capaz... Ele vai me matar...
Se antes ele estava com medo do que Wallace iria fazer com ele, agora ele estava apavorado. Se não fosse pelo fato de um vampiro estar apavorado com a ideia de outra pessoa matar ele, seria ate engraçado. Mas o fato de Lander temer tanto seja lá quem fosse essa pessoa misteriosa, o deixou com um pé atrás. Não tinha tempo para mudar de ideia agora. Ele precisava saber quem o queria morto e por quê.
Então, sem dizer nada, ele se levantou pegando Lander pelo colarinho e o lançou a mais de dois metros de altura. Lander caiu próximo do local onde Wallace havia sido lançado mais cedo por Lander.
Wallace saltou e girou o corpo em pleno ar a mais de dois metros e meio de altura. Ao cair no chão, ele socou a calçada ao lado da cabeça de Lander, partindo o concreto em vários pedaços e abrindo uma cratera pequena.
Lander, deitado de costas contra a calçada, olhou para o punho de Wallace na cratera.
- E você acha que eu vou fazer o que com você se não me responder? – perguntou Wallace sobre Lander. Obviamente ele não mataria o vampiro, mas ele não precisava saber disso, não é mesmo?
- Tudo bem, eu conto... – disse Lander suando frio. – Foi...
E mais rápido que um piscar de olhos, a cabeça de Lander não estava mais presa ao resto de seu corpo.
- Acho que esse alguém seria... – Wallace ouviu a voz de alguém vindo atrás dele. A mesma voz que ele ouviu antes de ter sangue pingado em sua boca naquele fatídico dia. – Eu.
Wallace se virou ficando de pé. Sob a ponte, em pé na mureta, arremessando para o ar como uma bola de basquete a cabeça decepada de Lander, estava um homem, bom, pela estatura, parecia ser um jovem em torno dos dezoito a vinte anos, assim como sua voz.
A pessoa misteriosa usava um capuz de moletom preto. Como um esquiador, ou simplesmente um ninja, uma mascara de pano negro cobria seu rosto deixando apenas seus olhos castanhos e com um brilho dourado visível. Diferente daquela noite em que o misterioso homem parecia um anjo, desta vez ele estava longe disso, brincando com aquela cabeça como se fosse uma bola, o capuz e o brilho escarlate da lua de sangue que se estendia por tudo, estando em um eclipse total, o misterioso homem parecia um demônio.
- Eu não disse que estava mais pra um demônio? – ele brincou.
Sua voz era surpreendentemente calma e confiante, além de transmitir a sensação de transbordar poder. Wallace sabia que ele estava de certa forma, além de seus limites.
- De fato, você não tem a mínima chance contra mim. – e surpreendentemente, não tinha um pingo de arrogância em sua voz. Ele apenas parecia estar dizendo a mais pura verdade.
- Q-Quem é você? – se recriminou por gaguejar.
O homem deu dois passos sem o menor sinal de desiquilíbrio.
- Isso não vem ao caso agora. Simplesmente estou sem tempo... – ele olhou para a enorme lua vermelha que enfeitava o céu e dava um ar apocalíptico para tudo. – Você sabia que um eclipse, seja lunar ou solar, é uma enorme fonte de energia, ainda mais quando se quer fazer uma viajem? – ele olhou diretamente nos olhos de Wallace e disse sem hesitação ou modo algum. – Sua querida irmãzinha, Lunniele, esta viva e bem... por enquanto. Naquele dia em que sua mãe estava a ponto de perder sua irmã, eu dei meu sangue pra ela. Como bem sabe, meu sangue tem propriedades curativas. Quando ela nasceu, eu a peguei. Tão pequena e tão frágil. – Wallace ouvia aquilo totalmente atordoado.
O homem desapareceu da ponte deixando a cabeça em pleno ar. Enquanto caía, Wallace ouviu o som dos gritos dos vampiros. Girou o corpo e viu apenas o final, uma rajada de ar passando entre todos e os matando arrancando as cabeças e os corações em pleno ar.
Quando todas as cabeças e corações atingiram o solo, Wallace sabia que o misterioso homem estava parado na ponte. Ele se virou e o encarou. Ele estava com a cabeça de Lander em mão.
Ele era tão rápido que terminou tudo antes de a cabeça de Lander atingir o chão e a pegou em pleno ar.
- Ela é minha prisioneira, e se você a quiser ver viva e bem, estarei te esperando na montanha mais alta de Aldenorah, mas se apresse, pois a vida dela só será permitida ate o Eclipse Triplo.
A cabeça de Wallace estava toda emaranhada. Sua irmã estava viva? Ela era prisioneira? Ele teria que salvá-la antes do que?
- Mas... – ele não conseguia formar uma palavra coerente.
Então, ao invés de martelar sua cabeça com perguntas, ele simplesmente resolveu agir. Decidiu a fúria tomar conta dele. Sua irmã estava viva. Sua única família. Sua decisão estava tomada. Ele iria protegê-la.
Usando a força que suas pernas adquiriram, ele saltou com o punho fechado visando socar o rosto do homem misterioso.
- ME. DEVOLVA. A. MINHA. IRMÃ! – ele gritou.
O homem simplesmente riu. Como se ele fosse capaz de se tornar invisível, ele desapareceu. Ele reapareceu em pleno ar chutando com uma força absurda a lateral do estomago de Wallace. Ele sentiu todos os ossos de seu tronco se quebrar em pedaços. Vomitou sangue.
- Estarei te esperando. Boa viagem. – misterioso homem disso como se fosse a coisa mais normal do mundo.
Wallace foi lançado contra o lago congelado, The Lake. Foi como se uma rocha de uma tonelada caísse das nuvens contra o lago. A camada congelada do lago se partiu em pedaços e a água que estava debaixo do gelo foi esguichada pra cima com a força do impacto.
Wallace, além do fato de estar sentindo uma dor excruciante com o chute que levou e resultou em ter seus ossos quebrados e órgãos internos perfurados pelos ossos, sentiu o frio congelante da água que já estava a quase trinta dias recebendo neve.
Sem ter forças alguma para nadar, ele começou a se afogar. Sua visão começou a ficar turva, embaçada.
Se imaginado se estava tendo algum tipo de alucinação ao testemunhar um tornado se formar dentro do lago, sem forças alguma, sentindo a água entrar pela sua boca, ele se deixou ser sugado pelo tornado. Sua visão foi ficando cada vez mais embaçada. Desta vez ele tinha certeza, iria morrer. Com esse pensamento, ouvindo um som de splash como se algo ou alguém pulasse no lago, sua visão escureceu no exato momento em que o tornado o atingiu e sentiu seu corpo ser desintegrado. Ele apagou.












Um comentário:

  1. Gostei muito, gostaria mais ainda se tivesse uma continuação, muito obrigado por esse começo incrível

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